terça-feira, 14 de maio de 2013

Disco de estreia dos Secos & Molhados completa quatro décadas como um marco da música brasileira.

(O Secos & Molhados em show no Gigantinho em 1973)
Foto: Nico / Hipólito / Banco de Dados ZH

NINGUÉM ESPERAVA. POUCA GENTE ENTENDEU. 
MAS TODO MUNDO GOSTOU.

Com uma postura que variava entre a transgressão e o deboche, misturando MPB com vertentes do rock em apresentações incendiárias, há 40 anos os Secos & Molhados tomavam de assalto o cenário da música brasileira. E deixavam uma marca até hoje indelével no imaginário musical brasileiro.

O disco de estreia, que completa quatro décadas de lançamento em agosto, começou a ser gestado nas dependências do Teatro Ruth Escobar, em São Paulo, no início de 1973. Na época, Ney Matogrosso, João Ricardo e Gerson Conrad já eram conhecidos dentro do circuito underground, protagonizando shows cada vez mais lotados e comentados. A boa propaganda boca a boca levou o trio a fechar contrato com a gravadora Continental e entrar em estúdio.

— O meu violão era o principio básico. A partir daí, acoplei três músicos (baixo, batera e guitarra) e fomos ensaiando, até que apareceu o Zé Rodrix e sugeriu, por exemplo, umas flautas ocarinas em Assim Assado. Já o Marcelo Frias criou a percussão da mesma faixa. O baixista veio com a sua influência progressiva e a flauta transversal nas canções suaves veio de Donovan Leitch, que eu ouvia muito na época — lembra o principal compositor do grupo, João Ricardo, via e-mail.

Três meses depois, o álbum homônimo com a icônica capa do fotógrafo Antônio Carlos Rodrigues chegava às lojas. Mesmo em um momento de renovação no rock brasileiro, com a saída de Rita Lee dos Mutantes e a estreia de Raul Seixas com Krig-ha, Bandolo!, o impacto entre a crítica e o público foi grande.

De saída, Secos & Molhados vendeu mais de 300 mil cópias, número digno de Roberto Carlos, o maior vendedor de discos da época.

— Foi um momento épico para o pop brasileiro. Em um dos períodos mais fechados da ditadura militar, aquele disco era pura vibração, pura energia. Não havia nada igual, e eles rapidamente viraram uma mania nacional — relata o jornalista e crítico de música Tárik de Souza.

A audácia das composições e as performances provocativas de Ney Matogrosso, que surgia no palco requebrando-se com pouca roupa e visual andrógino, invariavelmente causavam problemas com a censura. Gerson Conrad lembra que era comum um show do trio ser liberado para São Paulo e barrado em outra cidade sem muitas explicações.

— Éramos obrigados sempre a fazer uma apresentação para os censores para que pudéssemos liberar nossas apresentações fosse onde estivéssemos — comenta Conrad, atualmente dividindo-se entre música e arquitetura.

Ney Matogrosso, que desde a dissolução do grupo, em 1974, jamais deixou de incluir as canções dos S&M em seus shows, considera o álbum mais do que seu debut como cantor profissional:

— Foi meu jardim da infância, um jardim da infância bem barra pesada (risos). Enfrentamos o Brasil, o governo, a polícia, era transgressão pura.

A CAPA ANTOLÓGICA

Uma das capas de disco mais emblemáticas da música brasileira foi criada praticamente no improviso. Produzida pelo fotógrafo Antônio Carlos Rodrigues, a foto foi feita com os integrantes da banda sentados sobre tijolos embaixo de uma folha de compensado, coberta com um pedaço de plástico fazendo as vezes de toalha. Espalhados por ela, itens encontrados em armazéns populares — também conhecidos por secos e molhados — comprados na hora pelos próprios músicos. Em 1995, os Titãs fizeram referência à capa no clipe de Eu Não Aguento, do disco Domingo.

                                
UM CLÁSSICO EM 13 FAIXAS

Farto caldeirão de misturas musicais e poéticas, o primeiro disco dos Secos & Molhados tornou-se um clássico instantâneo. Para analisá-lo, convidamos o músico e compositor gaúcho Arthur de Faria, que ouviu as 13 faixas e deu seu parecer. Confira:

1. Sangue Latino — As três primeiras notas escutadas no disco, antes mesmo da percussão e bem antes do violão de 12 desafinado, anunciam um destaque do disco: o baixista Willy Verdaguer, dos Beat Boys (sim, os argentinos que acompanharam Caetano em "Alegria Alegria"...). Melhor desempenho que o dele no álbum todo, só o de Ney.

2. O Vira — Guitarras! Roque Pauleira! Tão pesado quanto permitiam os estúdio brasileiros de 1973! E numa inusitada conexão portuguesa muito hype naquele momento: fados havia de Chico e de Caetano e Chico Buarque — mas aqui o fado vira "vira". Ops.

3. O Patrão Nosso de Cada Dia — Como que ter desaparecido um compositor que estreia de forma tão brilhante quanto João Ricardo, que assina TODAS as músicas desse LP? E músicas e letras como essa. "Eu quero o amor da flor de cactus. Ela não quis." A voz de Ney tem aqui todas as cores.

4. Amor — Willy (músico de apoio, a banda era só o trio) esgoalepa. Ney, João e Gerson revezam vocais com brilhantismo. Um suave eco de Mutantes, lá no fundo.

5. Primavera nos Dentes Depois de folks e rocks, um blues. Viajandão, cartilha rock brasil 1973, com um longo solo OK de guitarra. Aos três minutos, os vocais, fazendo harmonia, (quase) salvam a pátria. Puta música chata (e longa)

6. Assim Assado — Brasil de roqueiro progressivo setentão. Flautas nordestinas, percussão, guitarra distorcida, variações de andamento, interlúdio instrumental em compasso de 7/4. A receita au grand complet executada com brilhantismo. Somando-se um Ney especialmente sensacional e letra pop pop pop, dá nisso: Puta música bacana. Até a ocarina se salva.

7. Mulher Barriguda — Booooogieeeeee! Quem precisa de Elton John se tem Zé Rodrix no piano? Mais ecos Mutantes.

8. El Rey — Parceria de Gerson e João, só os 3, vozes e violões. Uma lindeza que poderia estar no primeiro Clube da Esquina fácil, fácil. E tudo isso em 58 segundos.

9. Rosa de Hiroshima — Uma música tem que ser muito, mas muito boa pra resistir a 40 anos de luaus. É o caso. João musicando um poema nada Bossa Nova de Vinícius de Morais. Violão, baixo, duas frases de flauta: primorosa simplicidade.

10. Prece Cósmica — O cara se empolgou. Além de Vinícius, peitou musicar Cassiano Ricardo (aqui) e Manuel Bandeira (na próxima). Folk-jóia, que nem tinha samba-jóia. Mas, pombas, ninguém conseguia tocar violino afinado na música brasileira dos anos 70?

11. Rondó do Capitão — Parente de "Assim Assado", outra que mistura Brasil, folk e ecos de Portugal. Ney num registro mais grave, encantador.

12. As Andorinhas — Baita introdução. Baita pequena música (mais uma sobre poema de Cassiano Ricardo). Nessa a gente chega a escutar a Rita Lee de tão Mutantes...

13. Fala — Um grande blues chega pra redimir "Primavera nos Dentes". Que gênio esse Ney Matogrosso! E encerra o disco o único (e ótimo) arranjo de cordas, casado com brilhantismo ao moog e ao sintetizador de Zé Rodrix, no maior complexo de épico. Enxutíssimos 31 minutos que, merecidamente, inauguraram o milhão de cópias vendidas (e raramente igualadas) no rock nacional.

Fonte: Reprodução de Zero Hora - Segundo Caderno - Notícias - 40 anos de transgressão - 07/04/2013 16h45
http://zerohora.clicrbs.com.br/rs/cultura-e-lazer/segundo-caderno/noticia/2013/04/disco-de-estreia-dos-secos-molhados-completa-quatro-decadas-como-um-marco-da-musica-brasileira-4098753.html

quinta-feira, 2 de maio de 2013

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